Desde 1º de janeiro de 2022, o pacote de benefícios básicos coletivos holandês contém o Kaftrio®.
Kaftrio® é um medicamento para fibrose cística, uma doença rara que afeta cerca de 1.400 pessoas na Holanda. O preço pedido original da Kaftrio® era de aproximadamente EUR 194.000 (aproximadamente 1 milhão e cento e cinquenta e quatro mil reais) por paciente/ano.
O secretário de Estado responsável anunciou que negociou um preço “aceitável” com a Vertex, empresa farmacêutica que produz o Kaftrio® [1].
O Instituto Nacional de Saúde Holandês, o órgão de Avaliação de Tecnologias em Saúde em questão, considerou Kaftrio® custoefetivo após esta redução de preço.
No entanto, como os cientistas sociais sabem, value for money é uma construção - a ele é dado significado por pessoas específicas em contextos específicos; e é essencial considerar como é construído.
O preço dos medicamentos é um assunto muito debatido na Holanda no momento, mas também em outros lugares.
Vamos olhar para a história da construção da relação custo-benefício neste caso e colocá-la em contexto.
Há pouco mais de um ano, em 4 de maio de 2021, o National Health Care Institute aconselhou o reembolso do Kaftrio® apenas após uma redução de preço de 75% [2].
O raciocínio fundamental por trás disso tinha a ver com dois elementos. Primeiro, é claro, a eficácia do medicamento para os grupos de pacientes em questão foi crucial. Em segundo lugar, o processo pelo qual essa droga foi descoberta e desenvolvida desempenhou um papel essencial no raciocínio.
O Instituto observou que o Kaftrio® é uma combinação de vários medicamentos já desenvolvidos. Especificamente, contém três ingredientes que também fazem parte de outros medicamentos fabricados por esta empresa farmacêutica, nomeadamente Symkevi®, Orkambi® e Kalydeco®.
Esses medicamentos, todos moduladores do regulador de condutância transmembrana da fibrose cística (CFTR), são comercializados e reembolsados há algum tempo.
Isso significou que os custos de desenvolvimento do Kaftrio® foram considerados mais baixos do que o normal. Assim, o Instituto considerou o preço, portanto, “inexplicavelmente alto”.
A linha de raciocínio que leva em conta o processo de desenvolvimento está se inserindo nas discussões sobre reembolso. O resultado, em termos de custo-efetividade do medicamento (geralmente expresso em razões incrementais de custo-efetividade), não é mais considerado de importância primordial, ao avaliar esse tipo de medicamentos.
No ano passado, um player da inovação social farmacêutica, Medicijn voor de Maatschappij (Medicina para a Sociedade), desenvolveu uma ferramenta para calcular o preço de outro suposto medicamento de baixo custo de desenvolvimento, a mexiletina [3,4].
Esta ferramenta foi desenvolvida como parte das conversas sobre reembolso para este medicamento em particular. Namuscla®, versão de marca da mexiletina, não foi reembolsado porque o preço foi considerado excessivo devido ao baixo custo de desenvolvimento assumido.
Contudo, o Instituto Nacional de Saúde aconselhou o reembolso da versão preparada por um farmacêutico (a chamada preparação magistral) – e o Ministro da Saúde tornou isso possível através de uma alteração na regulamentação [5].
Uma resposta frequentemente sugerida para a questão do preço dos medicamentos é a transparência; e, sim, isso ajuda.
No entanto, o ponto essencial aqui é: o que conta no cálculo? Que tal oportunidades perdidas – todos os medicamentos que não chegam ao paciente? E quanto ao número de pacientes que serão tratados, ao longo dos anos, nacional e internacionalmente – especialmente porque a Vertex anunciou que está aumentando o número de indicações que Kaftrio® atenderia nos próximos dois anos?
Engajar-se na inovação social farmacêutica (SPIN) significa envolver-se com essas questões.
Uma perspectiva transnacional, em particular, comparando como os preços são construídos e negociados por diversos stakeholders em todos os países, pode ser útil aqui.
Referências
[4]van den Berg, S., van der Wel, V., de Visser, S. J., Stunnenberg, B. C., Timmers, L., van der Ree, M. H., & Hollak, C. E. (2021). Cost-based price calculation of mexiletine for nondystrophic myotonia. Value in Health, 24(7), 925-929.
Crédito da foto: Diana Polekhina (2021). Measuring Tape and Pills on Yellow Background [Image]. https://unsplash.com/photos/Xg-ut7qtJiM
Redigido por: Tineke Kleinhout-Vliek, PhD
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